ŷ

Katya's Reviews > The House of Fear

The House of Fear by Leonora Carrington
Rate this book
Clear rating

by
117844452
's review

bookshelves: lermaismulher

THE DEBUTANT
⭐⭐⭐⭐�
O ponto alto desta coletânea é sem dúvida o texto que abre um pequeníssimo conjunto de contos de fadas autobiográficos que têm tanto de Leonora que são, por si só, verdadeiras obras-primas.
Escrito em 1937/8 (como todos os demais), A debutante é um texto com um título autoexplicativo sobre uma jovem em idade de debutar que se recusa ir ao baile dado em sua honra. A solução: vestir uma hiena do zoo como se fosse ela própria, deixá-la ir ao baile em seu lugar e ficar em casa a ler (claro, até nisso é Leonora até ao tutano).
E a coisa até que corre mais ou menos bem:

In my room I brought out the dress I was to wear that evening. It was a little long, and the hyena found it difficult to walk in my high-heeled shoes. I found some gloves to hide her hands, which were too hairy to look like mine. By the time the sun was shining into my room, she was able to make her way around the room several times, walking more or less upright.

Por fim, falta só tratar um último pormenor:

The greatest difficulty was to find a way of disguising the hyena’s face. We spent hours and hours looking for a way, but she always rejected my suggestions. At last she said, “I think I’ve found the answer. Have you got a maid?� “Yes,� I said, puzzled. “There you are then. Ring for your maid, and when she comes in we’ll pounce upon her and tear off her face. I’ll wear her face tonight instead of mine.�

Espantosamente, esta é uma hiena bastante bem parecida (agora que adotou a cara da criada) e civilizada. Ninguém no baile dá por nada até ao derradeiro final. Infelizmente para a debutante, como que quebrando o feitiço, a mãe irrompe casa adentro a meio da noite para a chocante revelação:

“We’d just sat down at the table,� she said, “when that thing sitting in your place got up and shouted, ‘So I smell a bit strong, what? Well, I don’t eat cakes!� Whereupon it tore off its face and ate it. And with one great bound, it disappeared through the window.�

Numa evidente renúncia das convenções sociais, a debutante rebela-se (daí a forma da hiena - animal que sempre acompanha Leonora Carrington espiritualmente). Nessa duplicidade poder-se-á ler, claro, uma metamorfose espiritual, ou uma metamorfose física, até. Mas, com Carrington, nunca nada é o que parece. A ser assim, uma hiena talvez represente uma necessidade mais visceral de autocontrolo ou uma necessidade física de violência para conseguir independência. Ou talvez a hiena que nos parece metafórica seja só uma hiena que vai a um baile usando o rosto da sua presa...
Quem sou eu para julgar?

THE OVAL LADY
⭐⭐⭐⭐
É também de rebelião que trata o conto The oval lady no qual uma jovem burguesa (que mais tarde se transforma num cavalo) se encontra em greve de fome contra a tirania de um pai sem imaginação:

“I don’t drink, I don’t eat. It’s a protest against my father, the bastard.�

Habitando num mundo onde seres animados e inanimados se confundem, onde as formas são aquelas próprias dos sonhos - e do feminino, sem ângulos retos - uma jovem recusa crescer mesmo que para isso tenha de enfrentar o poder patriarcal.
Mais autobiográfico do que isto, só inventado.

THE ROYAL SUMMONS
⭐⭐⭐⭐�
Uma loucura dessas - a luta contra o poder instituído - é também o mote para The royal summons, um divertido conto sobre um sorteio para destituir (e, consequentemente, matar) a rainha louca de uma terra onde os ciprestes exercem a ordem.
Decidir isto ao ritmo de um jogo de damas não é nada demais...

The queen called me to her office. She was watering the flowers woven in the carpet.

A MAN IN LOVE
⭐⭐�
Assassinatos à parte, também aqui há histórias de amor. Mais concretamente, a história de amor de um simples merceeiro. Que nessa história de amor haja uma mulher morta cujo calor corporal ainda consegue chocar os ovos do galinheiro, é mero pormenor:

Walking down a narrow street one evening, I stole a melon. The fruit seller, who was lurking behind his fruit, caught me by the arm. “Miss, I’ve been waiting for a chance like this for forty years. For forty years I’ve hidden behind this pile of oranges in the hope that somebody might pinch some fruit. And the reason for that is this: I want to talk, I want to tell my story. If you don’t listen, I’ll hand you over to the police.�

UNCLE SAM CARRINGTON
⭐⭐⭐⭐
E já que falamos em ovos, isso leva-nos até ao tio Sam (prometo que já lá chego, ao tio e aos ovos - mais ou menos) e a duas míticas senhoras a quem a jovem protagonista de Uncle Sam Carrington recorre para terminar com o fastio de sua mãe (a quem a pancada do tio Sam - que tem a mania de rir à gargalhada em noites de lua cheia - já começa a incomodar).
Bem ao estilo de Alice no País das Maravilhas, numa história onde duas couves se envolvem num confronto físico (a chamada couve a murro - os ovos não entram nesta história, mas vá, estão no grupo dos acompanhamentos), as duas simpáticas velhotas que resolvem problemas familiares, fustigam vegetais até à rendição. O objetivo: sacrificarem-se pela felicidade das pessoas. Faz perfeito sentido.

“Young lady,� she said, offering me a Louis Quinze chair, “does your family descend from our dear departed Duke of Wellington? Or from Sir Walter Scott, that noble aristocrat of pure literature?� I felt a bit embarrassed. There were no aristocrats in my family. She saw my hesitation and said with the most charming smile, “My dear child, you must realize that here we deal only with the affairs of the oldest and most noble families of England.�(...)
I continued, confused, “there is a table on which, we are told, a duchess forgot her lorgnette in 1700.� “In that case,� one of the ladies said, “we can perhaps settle the matter�.


THE HOUSE OF FEAR
⭐⭐�
Menos sentido fará The house of fear, conto que dá nome à coletânea, e que termina numa aura de suspense e mistério. Basta dizer que lá pelo meio há animais vestidos de clérigos (o que vale sempre a pena), uma festa exuberante num salão de pavimento turquesa com juntas a ouro, e uma personagem cujas reminiscências, do mais banal possível, nos mostram que não é preciso perceber o que está a acontecer: o importante é estar lá para participar. Ou qualquer coisa desse género.

After the meal I smoked a cigarette and mused on the luxury it would be to go out, instead of talking to myself and boring myself to death with the same endless stories I'm forever telling myself. I am a very boring person,(...)talking to myself so much, I tend to repeat the same things all the time. But what can you expect? I'm a recluse.

No final disto tudo, a autora sai-se esplendidamente bem a pintar imagens com palavras. Precoces na criação da sua própria mitologia, estes contos são evidentes peças-chave para entender a artista que é Leonora Carrington. A mulher, essa, permanece o mistério que sempre quis ser.
23 likes · flag

Sign into ŷ to see if any of your friends have read The House of Fear.
Sign In »

Reading Progress

March 23, 2025 – Started Reading
March 23, 2025 – Shelved as: to-read
March 23, 2025 – Shelved
March 23, 2025 – Shelved as: lermaismulher
March 23, 2025 – Finished Reading

Comments Showing 1-4 of 4 (4 new)

dateDown arrow    newest »

message 1: by Paula (new)

Paula Mota Acho que é assim que o surrealismo dela funciona melhor, em pequenas doses. Aos contos em comum com a colectânea que já li, demos a mesma pontuação. Vou procurar os outros!


message 2: by Katya (new) - added it

Katya Só a Leonora para nos fazer concordar assim. Tenho a ficção completa dela, são duas coletâneas e um pequeno conjunto de dispersos. Mas, estrategicamente, comecei pela coletânea mais pequena - vamos dizer que para fazer uma leitura cronológica :)


message 3: by áپ (new)

áپ Linhares Nunca li nada da snehora, Katya, mas, pela tua review, tem histórias muito fora da caixa. :-)


message 4: by Katya (new) - added it

Katya áپ wrote: "Nunca li nada da snehora, Katya, mas, pela tua review, tem histórias muito fora da caixa. :-)"

Fora da caixa é uma boa expressão ;) A Leonora é uma artista que vale a pena conhecer.


back to top