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“27 de dezembro [1936]

O presente mais lindo n茫o 茅 o mais caro, 茅 o mais fr谩gil 鈥� a caixa de cubos com os quais as m茫ozinhas inexpertas poder茫o formar um prado florido, dois cachorrinhos brincando, a galinha branca, orgulhosa dos pintainhos.

H谩 ainda a bola de sete cores como um arco-铆ris de borracha, a piorra cantadeira e o pelot茫o de chumbo pregado no papel茫o.

Paro um instante comovido 鈥� ah, a roda da vida, roda da vida rangente ou azeitada! Quando acordei, acordei general 鈥� trinta e seis soldadinhos me esperavam ao p茅 da cama, t煤nica azul, cal莽a vermelha, baionetas em riste. As trincheiras foram abertas debaixo das beg么nias, as roseiras deixavam cair as p茅talas sobre os her贸is, todo o jardim sofreu com as batalhas delirantes, enquanto Madalena fazia comidinhas para a nova boneca e Emanuel folheava, no alpendre, o livro de gravuras de Rabier.

Deposito o 煤ltimo brinquedo com cuidado, n茫o fosse despert谩-las. Porejadas de suor, as crian莽as dormem. Na parede, como prego, dorme tamb茅m o pernilongo, pesado de sangue que tamb茅m 茅 um pouco meu, apesar da incredulidade rancorosa de Mariquinhas.”
― Marques Rebelo, O Trapicheiro

“24 de dezembro [1941]

A 谩谤惫辞谤别, embora atarracada, n茫o ocupa muito espa莽o 鈥� um canto de sala, o canto menos acess铆vel, do qual foi removido o musgoso vaso com espadas-de-s茫o-jorge, que alem de decorativas, segundo Felicidade, nos protegem do mau-olhado. O chacareiro queria um dinheir茫o por um pinheirinho de seis palmos, Lu铆sa descal莽ou a bota na loja de novidades. Trouxe-a embrulhada em papel pardo como volumosa sombrinha, e arm谩-la foi uma opera莽茫o f谩cil e divertida.

鈥� Veja! 鈥� e Lu铆sa exibiu-a, eri莽ada como um imenso paliteiro.

Meus olhos se anuviaram 鈥� as inven莽玫es deviam ter limites. A imita莽茫o infunde desprezo, mudo desprezo, a quem amou as 谩谤惫辞谤别s do Trapicheiro, ardentemente esperou por elas e substituiu o amor e a espera pela saudade. 脡 duma subst芒ncia assim como o celul贸ide, lustrosa como escama de cobra, dum verde horripilante, com frutinhos vermelhos, na ponta dos galhos, que lembravam os olhinhos dos ratos-brancos, que Pinga-Fogo criava e trazia ao ombro, sob o nojo e a reprova莽茫o de Mariquinhas, t茫o artificial quanto o mito que propaga.

N茫o pus na sua ornamenta莽茫o, bastante carregada, com um odioso cometa no cimo, os meus dedos descrentes, t茫o h谩beis para respingar pela ramaria antiga as velinhas multicores, as lanterninhas, o algod茫o como se fosse neve. Deixei a tarefa para as m茫os de Lu铆sa e das crian莽as, ne贸fitas aranhas, que alegremente se emaranhavam na teia de fios prateados que espalhavam pela galharia dura e sim茅trica.

Quando ficou pronta, e ao p茅 dela as crian莽as plantavam os 谩vidos sapatinhos, Lu铆sa perguntou radiante:

鈥� N茫o ficou linda?

(N茫o destruamos as ilus玫es dos amadores. Pelo menos algumas. Que culpa t锚m de que o tempo pr谩tico e mercantil ofere莽a um material t茫o reles e sem seiva?):

鈥� Sim, est谩 muito bonita.

鈥� E serve para muito tempo!

(脫 desalentadora durabilidade!):

鈥� 脡 贸timo.

E a sensa莽茫o me invade, n茫o sei se de t茅dio ou de derrota.”
― Marques Rebelo, A Mudan莽a

“24 de dezembro

A estrela da tarde est谩 subindo no c茅u com o seu brilho mais puro. Um momento de 迟谤茅驳耻补s na crueza de nossas vidas!”
― Marques Rebelo, O Trapicheiro